Alfred Hoffman, Jr., USA Ambassador in Portugal, wrote in the 4th of May, 2007, in "Jornal de Negócios", an article (in Portuguese) about Intellectual Property Rights, called "Proteger os Direitos de Propriedade Intelectual é um Dever de Todos". This article is completelly full of misconceptions, and I think there's a need to straight that issue out. Thus, I'm here going to cite
the article, and comment it. Since the article is in Portuguese, the rest of this article will also go on in Portuguese.
Alfred Hoffment começa o seu texto assim:
A expressão “Direitos de Propriedade Intelectual” é uma forma complicada de designar a responsabilização pela produção de um produto e a protecção da criatividade humana.
"Direitos" não designa "responsabilização", "produção", "produto" ou "protecção". E, a não ser que me justifiquem o contrário, eu vou continuar com a definição de "direito" que me dita o dicionário da Língua Portuguesa.
É o mecanismo legal que, através do direito de autor, das patentes e das marcas registadas, garante que os produtos que compramos são genuínos, e que outra pessoa não rouba as nossas ideias.
Errado. "Propriedade Intelectual", "Direitos de Autor", "Patentes" e "Marcas registadas" são quatro conceitos diferentes. Não existe relação entre "direitos de propriedade intelectual" e "produtos genuínos", nem esses direitos implicam a existência de um produto ou de uma compra. Da mesma forma, a "Propriedade Intelectual" não garante que as nossas ideias não são roubadas, mesmo partindo do princípio que existe o conceito de "roubar uma ideia" (que, já que é referida, gostava de ver explicada ou definida).
Os direitos de propriedade intelectual não protegem apenas os inventores.
Direitos não são protecção. Os direitos não protegem nada. Os direitos são
direitos, simplesmente. Eu tenho o direito de vestir roupa amarela em público, por exemplo. O que tem isso a haver com protecção? Não é diferente no caso dos direitos de propriedade intelectual.
Protegem todos aqueles cuja segurança depende da fiabilidade dos produtos em todos os países do mundo, incluindo Portugal.
Obviamente que não: a propriedade intelectual não define qualidade ou fiabilidade. Eu posso desenvolver um produto do qual tenho a propriedade intelectual, que é tão mal feito que está cheio de defeitos e que não é fiável. O facto de ter propriedade intelectual sobre ele não faz desse produto mais fiável.
E assim decorre o primeiro parágrafo. Como podem ver, não existe parte dele com a qual eu concorde... É esta a introdução que dão a um artigo sobre os Direitos de Propriedade Intelectual? Bem, se continuarmos a ler o artigo, entendemos o porquê desta introdução: o seu autor não está a falar de propriedade intelectual. Mas não é aí que me choca: um político vir a público defender os seus ideais políticos? Pois claro, todos devemos ter a liberdade para o poder fazer, e não a contestarei a alguém só porque as minhas ideias divergem das apresentadas, no entanto, a confusão de tópicos passa ao ridículo e deixa de o ser quando chegamos a parágrafos como este:
Num mundo em que as ideias são uma moeda de troca comum a todos os países, a pirataria de propriedade intelectual corrói a economia e a identidade cultural dos países.
Ora, eu
não conheço um mundo em que as ideias são uma moeda de troca, muito menos comum a todos os países. Certamente
o nosso não o é. Não conheço tal conceito de
pirataria de propriedade intelectual, mas consigo adivinhar o que o autor quer dizer. Façamos no entanto o exercício fictício de pensar num mundo em que efectivamente as ideias fossem a moeda de troca comum. Como poderia existir ou aplicar-se a propriedade intelectual nesses casos? Se eu pago bens com ideias, o detentor da ideia não muda de mãos? Então, de quem é a propriedade intelectual? Como podemos ler
aqui, e passo a citar,
O copyright protege expressões mas não as ideias em si; isso está escrito em todo o direito de copyright. Sem essa distinção entre forma e conteúdo, concebida no final do século XVIII por filósofos como Johann Gottlieb Fichte, o copyright iria implodir ou explodir. Não podemos invocar o copyright para proteger factos, palavras, acordes ou cores, mas se pegarmos num número suficiente deles e combinarmos-los de acordo com o que nos passa pela alma, podemos atravessar o “limiar da originalidade” e entrar no domínio das obras de arte.
Em Portugal, tal como em qualquer outro país da Europa, as ideias não são legalmente resguardadas, e felizmente. A única tentativa para que isso mudasse é a das chamadas
patentes de software, que tentam patentear ideias, o que por si só é uma
má ideia, na minha opinião, e que, de qualquer forma, não existe, pelo menos ainda, em Portugal. De qualquer forma, e ainda que existissem, a realidade é que
a patenteabilidade de ideias restringe os direitos de Autor. Finalmente, há que dizer que é a partilha da arte que ajuda à evolução e criação de uma cultura, comunidade e identidade. Se se transformam ideias em moeda de troca, não seria a sua pirataria que iria "corroir a economia e a identidade cultural": a não partilha/comercialização de ideias faria com que se reduzisse o grupo ao individualismo, criando a "economia do um", e abolindo o conceito de "identidade cultural de países", pois cada um teria o seu conjunto de "objectos culturais", como se de um bem se tratasse. Mas deixemo-nos de cenários distópicos...
[...]copiar CDs de música portuguesa prejudica a indústria musical e torna-a menos competitiva no mercado global.
Sendo eu contra a cópia
ilegal de CD's, tenho no entanto que desmistificar o que aqui foi dito. Em primeiro lugar, os estudos não financiados pela indústria discográfica costumam indicar a pirataria de música como um dos grandes impulsionadores da sua compra, e não o contrário. No entanto, também ditam estudos de mercado, as pessoas mais "educadas musicalmente" têm tendência a ter nas suas preferências música que é editada não pelas major labels mas sim pelas pequenas editoras. Finalmente, existem ainda estudos que dizem que, percentualmente, há menos música independente a ser pirateada que música editada pelas major labels. Mas ignoremos isso e foquemo-nos na indústria musical que lança a música Portuguesa, e veremos qual a sua relação com a força de competitividade das editoras Portuguesas no mercado global. A maioria da música Portuguesa é lançada pelas major labels, e mais de 80% da música
Portuguesa vendida é de editoras que não são Portuguesas. Realce-se que aqui estou a considerar editoras como a "Valentim de Carvalho", visto que esta é pertencente à EMI. A cópia de CD's de música Portuguesa não prejudica as editoras Portuguesas, nem as torna menos competitivas no mercado global - bem pelo contrário. A música Portuguesa não prejudica a indústria discográfica, como um todo, visto que o conceito de indústria discográfica engloba não só as editoras como também
muitos outros elementos, como músicos e compositores. O que a pirataria de CD's afecta, isso sim, é
o mercado mundial de música, visto que este é controlado pelas "grandes quatro" major labels (Warner, EMI, Sony e Universal) que, em 2005, tinham 81.87% do mercado.
Devíamos encarar o desrespeito pelos Direitos de Propriedade Intelectual como uma nova forma de pirataria – só que, em vez de roubos em alto mar, trata-se de roubo electrónico da propriedade de alguém.
Encarar o desrespeito pelos Direitos de Propriedade Intelectual como crime? Não, encaremos o desrespeito como uma
liberdade. Eu não respeito certas pessoas ou entidades, por exemplo, e não é por isso que estou a cometer um crime: bem pelo contrário, estou a exercer um meu direito - o da opinião. Devíamos encarar a
violação dos Direitos de Propriedade Intelectual e os Direitos de Autor (que, como já referi, são diferentes) como um crime? A lei Portuguesa já o faz. Mas "roubo electrónico da propriedade de alguém"? Nem pensar! Pare-se, por favor, de utilizar o chavão do "pirataria é um roubo". Não o é, e não é encarado como tal na lei - felismente. Roubo é privar a alguém de algo que era seu por direito, para ficar com a posse do objecto roubado. Se eu copiar um CD e dele fizer quinhentos, para os ir vender (aquilo a que é chamada a pirataria informática), onde está o roubo? É ilegal, correcto, mas não é um roubo, ninguém ficou privado do CD original, usado para a cópia! Contrafacção não é roubo.
Segue-se o parágrafo mais hilariante de todo o artigo:
Como vários oradores realçaram durante a conferência sobre Direitos de Propriedade Intelectual que a Embaixada dos EUA em Lisboa patrocinou, no passado mês de Março, uma inadequada protecção desses mesmos direitos fragiliza a imagem de uma empresa e provoca perda de quota de mercado. O que, por sua vez, prejudica os programas governamentais, assim como o emprego público e privado, sendo que os próprios consumidores acabam por pagar o custo em termos de saúde e segurança.
Não estive presente na dita conferência, mas o que se diz neste parágrafo é que se uma empresa não proteger adequadamente os seus direitos os consumidores dos seus produtos têm o seu governo, o seu emprego, a sua saúde e a sua segurança em risco. Credo! Estou ansioso por saber que empresas estiveram nessa conferência: concerteza que eu não quero ser consumidor dos seus produtos!
As leis que regulam a atribuição de patentes encorajam a descoberta de novos e melhorados produtos e processos ao mesmo tempo que asseguram, tanto quanto possível, o acesso do público a informação sobre esses novos produtos e processos.
As leis que regulam a atribuição de patentes... regulam a atribuição de patentes. Não encorajam nada, não melhoram nada, não asseguram nada além de que determinada patente deve ser atribuída ou não, e não informam ninguém sobre produtos ou processos. De qualquer forma, patentes não estão relacionados com direitos de propriedade intelectual.
A legislação sobre marcas registadas encoraja o desenvolvimento e a manutenção da alta qualidade de produtos e serviços e ajuda as empresas a garantir a fidelidade dos clientes.
Como? Que tenha conheciamento, a legislação sobre marcas registadas permite, apenas, a criação e o registo de marcas, para que empresas ou indivíduos possam criar uma marca e uma imagem em volta da mesma. Uma marca não encoraja qualidade. Quanto à ajuda que dá às empresas para garantir a fidelidade dos clientes, apesar de isso ser verdade, não vejo a sua relação com os direitos de propriedade intelectual.
Finalmente o artigo termina dizendo que:
As tecnologias de informação e as comunicações, os medicamentos seguros e as outras inovações que formam a espinha dorsal da economia moderna só são possíveis por causa dos direitos de propriedade intelectual. A esperança que todos temos num futuro risonho, depende daqueles inventores e inovadores que farão do mundo um lugar melhor – se os seus esforços criativos e trabalho forem protegidos.
É uma opinião, e deve ser respeitada como tal. Convém é frisar que esta é uma mera
opinião, e não uma verdade universal.